domingo, 27 de setembro de 2015

As mulheres do interior


Aqui todo mundo conhece todo mundo, todo mundo gosta de falar mal da vida de todo mundo, mas todo mundo apronta tentando esconder de todo mundo, com medo que todo mundo saia falando...

BEM VINDO A CIDADE DO INTERIOR!
Se oferecem boa qualidade de vida para as famílias, para você solteiro(a), viúvo(a) e/ou divorciado(a), ela só serve para dormir, porque a modernidade e praticidade das grandes cidades passam longe daqui!
Tive um parente que criticava todo tipo de mulher ‘emancipada’, falou horrores de mim quando me separei. Com sua passagem precoce para o outro plano – e não vou poupar a língua porque ninguém vira santo só porque morre – vim à saber das suas infinitas traições enquanto vivo: justifica bastante o exagero do seu moralismo. Depois a família veio criticar a postura da esposa por curtir a vida de solteira antes mesmo do corpo dele esfriar: no meu entender, ela fez tudo que pode para ele em vida, e como dizia minha avó, viúvo é quem morre!
O estigma das separadas é um pouco pior que das viúvas que não tiveram escolhas: as separadas são as piranhas que abandonaram maridos tão bons, e ainda se tornam ameaças aos ‘bons’ casamentos das amigas.
Recentemente um ente querido foi surpreendido pelo abandono da esposa. Minha língua afiada palpitou que ela deveria ter outro, já que eles eram tão apaixonados, ele um pai participativo, esposo trabalhador e atencioso. Eu sei que toda história tem dois lados, e só vivendo sob o mesmo teto para deixarmos cair nossas máscaras, mas jamais a julgaria ou lançaria pedras sabendo que meu teto é de vidro... só não fazia sentido a explicação dela para o cônjuge justificando o fim da relação!
Meu faro feminino nunca me deixou na mão, e foi minha primeira psicoterapeuta que me incentivou a explorar mais minha sensibilidade: que quanto mais a ouvisse, mais ela afloraria... E de fato, isso aconteceu. (vocês mulheres deveriam tentar, carregam Grandes Deusas dentro de si e não reconhecem!)
O cônjuge teve a humildade de reunir a família para explicar os motivos DELA, pois achou injusto os comentários que começaram a partir da minha maldosa língua. Dei de ombros, estava convencida que cada um tem o que merece, e só o tempo para nos mostrar a verdade... e esse tempo só durou três meses: ele  flagrou a bendita com seu ‘namoradinho’ na frente de casa, e ao investigar, descobriu que eles se conheceram na internet e que o relacionamento se estendia há pelo menos um ano.
Como eu disse, meu teto é de vidro, portanto não quero criticar nem ser preconceituosa, mas nos dias de hoje, uso desenfreado de internet não combina com casamento: o casal já está afastado por conta da rotina, e no lugar do diálogo, de se redescobrirem e de fazerem coisas juntos, cada um se enfia num computador – tão pertos e tão longe – num mundo virtual onde o novo é legal e o proibido instiga até os mais santos.
Quando o meu divórcio aconteceu, não tive apoio de pais, família, melhores amigos; somente ouvia que eu era uma louca em assumir meus filhos sozinha, sem respaldo financeiro e emocional. Anos mais tarde me surpreendi ao aconselhar uma amiga traída a não abandonar o esposo: na verdade, ao contrário do que todos pensam, não é porque sou frustrada com os homens que não acredito na instituição família ou no amor. É que esta amiga não aguentaria passar por tudo que passei e ainda passo, sem dizer que ela também não possui condições financeiras de se assumir sozinha. Convencida disso, foi sensata em perdoar o deslize do cônjuge, finalmente voltou  a estudar, e deixou para decidir no futuro, quando estiver com o diploma em mãos, o que fará da vida e dessa relação.

Eu reconheço que coloquei minha carroça na frente dos burros, que minha escolha teve um preço alto (perdi amizades, fui e ainda sou rotulada, e diminuiu muito o padrão social meu e dos filhos), mas não me arrependo de nada! Tive grandes lições, me reinventei, me descobri como mulher, amadureci... e essas coisas mastercard não compra.
Há quatro anos solteira pela segunda vez, e pelo menos há um ano emocionalmente independente, ainda carrego os estigmas da separada, da blogueira dos contos eróticos e da consultora de sexy shop que aconselha as mulheres com problemas sexuais com seus parceiros, mas hoje eu nem ligo. Apesar de eu ter abandonado tal profissão, ainda sou solícita quando algumas clientes me procuram, mas eu sei que a maioria do povo me banaliza por isso, como se falar de sexo fosse algo sem importância, só diversão, e eu a boba da corte que faz todo mundo rir... sinceramente, não me resumo a isto!
Sempre ouço das amigas e antigas clientes, que me invejam por não terem a coragem de mudar suas histórias: à essas que vivem a Síndrome da Gabriela, meu sinto muito. Cidade de interior é assim mesmo, as pessoas gostam de viver em paz, no conforto, tipo família doriana, fingindo ser o que não são... Mas cada um sabe o que é melhor para si, e cada um também paga um preço alto pela escolha de manter uma relação de mentira.
Enquanto no interior os moralistas tentam esconder a hipocrisia que vivem (afinal, aqui as histórias circulam na velocidade da luz), nas cidades grandes casais frequentam swing, divorciam-se para casar com cunhada, trepam com a esposa do vizinho, vivem sua homossexualidade, e não se preocupam em esconder, porque na correria que todos vivem, ninguém tem tempo de se preocupar com a vida de ninguém! Já aqui, se você for casado, até pode cometer deslizes; se é o traído, também pode dar uma coça na esposa, perdoá-la e depois voltar a beber cerveja com o amigo que colocou seu chifre, mas se a mulher for a traída e não for bondosa o bastante para perdoar o esposo, ela terá somente duas opções:
1.Não se importar do rótulo de vadia, como se ser separada fosse o mesmo que escrever na testa: estou desesperada; ou
2. Aceitar Jesus e freqüentar semanalmente uma instituição religiosa e jamais viver sua sexualidade, pois essas coisas da carne não é de Deus e nem feitas para mães de família  - como se ser mulher e ser mãe fossem a mesma coisa, ou ainda, como se o sexo só servisse para fazer criancinhas mal educadas! Se fosse, Deus seria maldoso demais em nos criar com tantos pontos sensíveis no corpo, e ainda nos manter sempre atentados.
Prazer não significa estar em pecado, e se abster em sofrimento, não torna o ser humano virtuoso. A mesma psicoterapeuta que me incentivou a ouvir a minha intuição também me ensinou que não existe maior religiosidade que sermos sinceros à nossa alma, então, se não prejudico outrem, não estou transgredindo nenhuma Lei, portanto, não estou em pecado.
Mal assinamos a carta de alforria e já somos sentenciadas a carregar o estigma de ameaça, tanto para eles (de influenciarmos suas esposas) quanto para elas (de serem traídas), então para que gastar energia tentando mudar algo já embutido, se merecendo ou não, sempre seremos mal vistas, mal faladas, mal compreendidas? Cabe à você ligar ou não para isso... 
Sabe o que é mais engraçado de tudo? Que mesmo sendo tudo isso, ainda somos objetos de desejo de todos homens, e muitos 'casados' fariam de tudo para dormir entre nossas pernas! kkkkk
Lamento informar aos que esperam na fila, mas somos areia demais para o caminhãozinho de vocês. Não que o problema esteja nas cidades ou nos homens do interior (há exceções), sou madura o suficiente para compreender que o problema está nas pessoas, porém, em lugares menores o comportamento social é outro, e raramente encontraremos algum tipo de reconhecimento, ou um solteiro que nos assuma junto aos nossos filhos. 
Se aqui nasci e aqui me estabeleço, aqui não me sinto pertencer: alma grande demais para um lugar tão pequeno e medíocre.

(Parte extraída da postagem da própria autora, em 10/2013, no site que foi colaboradora :http://cerebromasculino.com/as-mulheres-do-interior/)

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